Carregando, aguarde...

O Impacto da Mudança do Processo do McDonalds em seu Portfólio de Sanduíches

Por Guilherme Carvalho

ago 25 2017

Gestão Estratégica

COMPARTILHAR VIA:

Não sou um especialista em McDonalds. Sou um admirador.
Mas não sou um admirador de seus produtos.
Sou um admirador de seus processos e seu modelo de negócio.

Me mudei para a Índia em fevereiro de 2008. Me lembro bem que uma das coisas que me chamou a atenção por lá foram as lojas do McDonalds.
Apesar das lojas de lá serem fisicamente parecidas com as do Brasil, seu cardápio era totalmente diferente.

Recheados de hambúrgueres vegetarianos e de frango, eles não ofereciam nenhuma opção de hambúrguer de carne. O único sanduíche que eles tinham lá que também temos aqui era o McChicken.

Mas não foi só isso que me chamou a atenção. Uma outra particularidade me chamou mais atenção: o McDonalds de lá não era um fast-food.
Devido a quantidade de veganos que existem na Índia, o queijo era opcional nos sanduíches. Portanto o sanduíche não ficava pronto na prateleira, como era aqui no Brasil. Você pedia, sentava e, então, algum atendente levava em sua mesa.
O resultado disso era uma espera atípica para os restaurantes da rede.

Essa prateleira com os diversos sanduíches era parte fundamental da estratégia de agilidade do McDonalds. Ao pedir um sanduíche, ele já estava feito, bastava pegá-lo da prateleira.
O processo de produção de sanduíches era caracterizado por ter um “supermercado” de produtos acabado, conforme mostra o mapa abaixo:

Processo Produção de Sanduíches McDonalds

Processo Produção de Sanduíches

A vantagens dessa estratégia de processo, sem dúvidas, é a agilidade na entrega.
Se o segmento de mercado que você trabalha exige agilidade e rapidez na entrega e seus processos não são ágeis e rápidos, a melhor coisa a fazer é estabelecer um supermercado de produto acabado.

O processo nas lojas da Índia estava desenhado para ser o mesmo. Mas não era.
Eles não enchiam esse supermercado, as prateleiras estavam sempre vazias e, então, o sanduíche demorava para ser entregue.

Por outro lado, essa estratégia requer uma gestão e conhecimento da demanda fora de série.

Você não quer deixar na prateleira do supermercado um item que não vende. Afinal você gastou matéria-prima, equipamento, insumos, mão-de-obra para produzi-lo. No caso do McDonalds ainda havia um agravante: o produto vence. Ou expira, se for esse o termo usado no seu segmento de negócio.

Portanto queremos deixar nas prateleiras desse supermercado uma quantidade de produtos que atenda a demanda, ou seja, que os clientes encontrem o que precisam, mas que, ao mesmo tempo, não seja uma quantidade que aloque um capital em estoque grande ou que seja consumida tão lentamente que meu estoque vença.

Está entendendo o desafio?

Pois então, o dimensionamento desse supermercado, a prateleira de sanduíches que víamos nas lojas dos McDonalds, dependia das seguintes variáveis: loja, dia da semana, horário, sanduíche.
Nessa época o McDonalds tinha – me ajudem aqui, porque estou lembrando de cabeça – 6 sanduíches padrões (e mais alguns comemorativos que iam e vinham). São eles:

  • Hamburguer
  • Cheese Burguer
  • Cheddar McMelt
  • Big Mac
  • McChicken
  • McFish

Uma loja que abrisse 12 hrs por dia, todos os dias, teria em média 210 configurações possíveis desse supermercado. Isso porque excluí o McFish (alguém come isso?) e agrupei o nível de demanda de 2 em 2 horas – 7dias por semana x 6 agrupamentos de horas x 5 sanduíches. Ainda estou ignorando totalmente o efeito início/final de mês.

E funcionava!

Mas o McDonalds estava satisfeito? Ele parou por aí? Não!

Veja bem, a complexidade do entendimento da demanda e nivelamento e balanceamento do supermercado nessa estratégia de processo limita o seu portfólio. Se aumentar 1 sanduíche nessa prateleira saímos de 210 para 252 configurações de supermercado. Mais 1 sanduíche? 294 combinações!

Essa estratégia de negócio já não atendia mais o modelo de negócio que eles queriam.

Então, não sei dizer exatamente em qual momento, o McDonalds fez uma mudança fundamental em sua estratégia de processo produtivo para ampliar a oferta de seu principal produto: o sanduíche.
Ele acabou com o supermercado de produto acabado. Hoje em dia não existe mais a prateleira com os sanduíches prontos.

O que eles fizeram foi remodelar a estação de trabalho de montagem do sanduíche, deixando todos os ingredientes de montagem de todos os sanduíches a mão, e começaram a tratar essas posições de ingredientes como um supermercado de matéria-prima para montagem.

Então o processo começou a funcionar desse jeito:

Processo Atual McDonalds

Processo Atual do McDonalds

Mas o que isso permitiu?

Esse movimento na estratégia de processo permitiu ao McDonalds ampliar o seu portfólio de sanduíches. Hoje, no cardápio da loja, você encontra 14 sanduíches diferentes de carne, 4 de frango e 1 de peixe (sério, alguém come isso?).

Mas eu ainda não tenho uma sazonalidade extrema no produto final que depende de sanduíche, horário, dia de semana e até dia do mês?
Sim, mas algumas coisas mudam quando você coloca esse supermercado atrás do processo de montagem.

Você soma e agrupa demandas de itens comuns como hambúrgueres de carne, alface, cebola, tomate, por exemplo. O que reduz a sazonalidade na demanda dessas matérias-primas, além de ser agora apenas 1 item para armazenar e não mais esse item dentro de cada sanduíche diferente.

Você pode armazenar em quantidades maiores (reduzindo a frequência de reabastecimento) e em melhores condições, no caso dos molhos, por exemplo. Os molhos armazenados como molhos podem estar em recipientes maiores e refrigerados, o que aumenta a duração dele comparado com quando já manuseado e aplicado em um sanduíche quente.

Essa mudança de processo permitiu um aumento na oferta de tipos diferentes de sanduíches sem prejuízo para a agilidade de entrega. Para isso as duas mudanças foram necessárias: mudar a posição do supermercado e mudar a estação de trabalho de montagem de sanduíches.

Sem elas dificilmente o modelo com 19 sanduíches diferentes, mais alguns sazonais/comemorativos, funcionaria.
E mais, esse novo modelo atende as particularidades de lojas do mundo todo como era o caso de colocar ou não queijo nos sanduíches da Índia.

“Dentro de um pensamento de gestão e melhoria contínua não precisamos de justificativas para mudar, temos é que nos explicar quando não o fazemos.”

Muito provavelmente, foi a necessidade de aumento na oferta de sanduíches que motivou a mudança de processo. De qualquer maneira, dentro de um pensamento de gestão e melhoria contínua não precisamos de justificativas para mudar, temos é que nos explicar quando não o fazemos.

E é isso que admiro no McDonalds.